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Ensinar & Aprender: (AC) A Investigação-Ação: Natureza e Validade
- 17 de Junho, 2022
- Publicado por: Educação Online
- Categoria: Noticias
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Este pequeno mas objetivo trabalho do Professor Doutor António Simões é consubstanciado em várias obras (24 mais precisamente) cujos autores são sobejamente conhecidos como, por exemplo, J. Ardoino e A. Esteves. Estas razões parecem-me, só por si, suficientes para o considerar um excelente contributo no sentido de se entenderem as inúmeras problemáticas da Investigação-Ação (I-A) já que permite ao leitor identificar a sua origem, a sua definição, os seus sentidos, as suas características, os seus objetivos, as suas fases/etapas e permite ainda reflexões sobre a cientificidade das investigações que estão associadas a todo o processo uma vez que desenvolve assuntos sobre as dúvidas que suscitam no que respeita à sua validade e sua legitimação.
O texto em estudo apresenta uma introdução onde é destacado a relação entre os dois paradigmas predominantes (qualitativo e quantitativo) usados na investigação educacional. Seguidamente debruça-se sobre a “Natureza da Investigação-acção” (p.40) fazendo uma alusão à origem da I-A, aliás lugar comum de quem escreve sobre este tema, e sobre a “expressão polissémica” (p.40) do termo procurando atribuir a cada conceito expresso uma estratégia de implementação da I-A. Dedica, no seguimento do título do artigo, um capítulo à “Validade da I-A” (p.43) onde destaca o foco do investigador na ação em detrimento da “replicação e generalização dos resultados” (p.43) debruçando-se sobre as ameaças à validade interna e validade externa da investigação. Na conclusão pretende ressaltar as notas positivas da I-A ao dizer que existem maneiras de ultrapassar os problemas de validade, não apontando, no entanto, nenhuma medida (provavelmente devido à limitação do espaço para a elaboração do artigo).
O autor começa por realçar o conflito existente entre os dois “paradigmas” (p.39) ou “modelos” (p.40) aplicados na investigação educacional ligando o quantitativo a filosofias e epistemologias lógico-positivistas e o qualitativo às naturalistas-fenomelogistas concluindo este raciocínio dizendo que atualmente essa guerra já não existe mas sim o contrário, ou seja, uma complementaridade pacífica entre eles. Simões assume essa pacificação apontando a I-A como prova desse vínculo.
Numa postura de clarificação sobre eventuais dúvidas da cientificidade da investigação usada na I-A e baseado em Ardoino (1983) alerta que se deve separar “questionamento e investigação” (p.41) e “pesquisa científica e solicitação praxeológica” (p.41). Neste seguimento, a comparação com outros processos de gerar conhecimento para aplicação na prática costuma ser visto por muitos como um “escândalo epistemológico” (Ardoino, 1983:22, cit. Simões, 1990:42).
Resume ainda as fases do processo cíclico (ou, como muitos preferem, processo em espiral) da I-A em três, constituindo, deste modo, o número mais reduzido de etapas atribuídas por outros autores aos procedimentos, que são: o “ planeamento, a acção, a avaliação, à qual se segue, de novo, o planeamento, etc.” (p.43).
Como objetivos da I-A aponta também três: “produzir novos conhecimentos, modificar a realidade e transformar os actores” (p.43) ou, como refere mais à frente, “conhecer, agir e formar” (p. 43).
Não vislumbrei no texto em estudo qualquer referência clara aos problemas éticos com que se depara um processo de I-A. No entanto, Simões, embora não se refira explicitamente a estas questões apresenta matéria suficiente que permite obter algumas reflexões nesta área.
Ainda um outro apontamento sobre este assunto: será que o profissional está preparado no que concerne ao domínio dos métodos/técnicas de investigação para se abalançar num projeto de I-A fazendo com que os resultados sejam aceites pela restante comunidade? Como se obtêm essas acreditações?
Simões chama a atenção para a complexidade que existe em torno de um processo de I-A tendo em conta os três objetivos já apontados (“conhecer, agir e formar” – p.43). Refere, por exemplo, que pelo facto de existir um investigador/prático, ou seja, um investigador/profissional, ter de se posicionar como um observador participante, podem surgir dilemas entre as duas partes mentais/filosóficas envolvidas simultaneamente: a investigação e a ação. Justifica-se dizendo que a parte prática apenas se preocupa com a ação e a parte investigadora com a validade da investigação no que respeita à replicação e generalização dos resultados.
Refere a este propósito a distância que se pede ao investigador em estudos de outra ordem de grandeza, diferentes da I-A, devido a conhecerem-se os perigos que podem surgir se existir demasiada proximidade entre o investigador e o objeto de estudo. Como colmatar este embaraço? Simões sugere uma defesa através da chamada “I-A emancipatória, em que toda a responsabilidade pelo processo (acção e reflexão) é atribuída aos práticos” (p. 44), não havendo lugar neste tipo de investigação a investigadores externos fora da envolvência com o problema. Portanto, deduz-se claramente que este pressuposto/exigência faz parte das características intrínsecas do método.
Simões alerta que a I-A não é um processo fácil e que não deve ser confundido como um novo paradigma de investigação concorrente dos dois conhecidos. Prefere dizer que é uma “alternativa metodológica, no campo das ciências do homem e da sociedade” (Ardoino, 1983:23, cit. Simões, 1990:48).
Simões, sem negar a possibilidade de poder existir validade interna e externa num processo de I-A, alerta para as dificuldades de uma pretensão dessas ao afirmar que, para se conseguir vislumbrar essa legitimação, teria de se descrever o fenómeno “(…) em termos de características típicas (…) variáveis participantes, lugares, quadros teóricos, estratégias de investigação” (p. 47), ou seja, teriam de se encontrar problemas idênticos em outras práticas semelhantes. Conclui afirmando que existem “maneiras, mais ou menos eficazes, de lhe fazer frente” (p. 48), sem no entanto sugerir nenhuma em concreto, mas, certamente, baseado nos pressupostos, pouco plausíveis na minha opinião, que apresentei na penúltima citação.
O texto em estudo aponta claramente para o cuidado que se deve ter no caso de se pretender atribuir os desígnios de validade interna e/ou validade externa à I-A.
A maturação será a grande ameaça à primeira validade já que na replicação do estudo os comportamentos dos sujeitos serão, muito provavelmente, diferentes não me parecendo ser coerente nem funcional a possibilidade da replicação do estudo através de outro investigador/profissional ou mesmo através do mesmo investigador/profissional pois os sujeitos já não seriam os “mesmos” uma vez que teriam aprendido algo na primeira investigação fazendo com que os resultados fossem provavelmente diferentes. Uma das soluções para colmatar este constrangimento seria, talvez, a replicação do estudo com o mesmo investigador/profissional mas através da triangulação de métodos/técnicas.
No que respeita à validade externa, a aplicação dos resultados de uma investigação muito particular, obtidos num contexto muito específico relacionados com uma prática de trabalho de um profissional/investigador, numa ação em outro contexto também muito específico e com outros agentes, seria, muito provavelmente, outro grande fracasso. Mas ressalvo, mais uma vez, à semelhança do que sugere Simões, que tudo dependerá da complexidade do objeto de estudo, da postura epistemológica do investigador perante esse objeto e da recetividade do grupo alvo. Como diz o autor em estudo teriam de se escolher construtos de investigação sem serem específicos de um grupo de sujeitos e sem estarem integrados num determinado contexto particular.
Afigura-se ainda outro grande problema com a questão da validade externa: a I-A tem uma característica única relativamente a outras alternativas metodológicas que é a continuidade do processo numa perspetiva cíclica/espiral. Deste modo, se quiséssemos generalizar os resultados, pergunta-se: que conhecimentos/resultados, provenientes de uma das (várias) investigações, integrada na I-A, deveríamos aplicar num outro grupo alvo? Os do primeiro ciclo, os do segundo ciclo, ou os de outro número de investigação? E o outro grupo alvo estaria no mesmo estádio problemático que o grupo alvo de origem? Ora, a implementação duma ação baseada em conhecimentos provenientes de uma das investigações que não fosse suportada pelo grupo alvo que deu origem a esses conhecimentos já não teria as caraterísticas para ser considerada uma I-A. Sobressairiam assim os problemas éticos e de eficácia pois o grupo alvo de destino não tinha participado na investigação dando azo, provavelmente, a desmotivações e a repulsas no que concerne à aceitação da ação.
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Luis Ricardo (2011)
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